Muito se discute hoje, a alegada necessidade de adaptação do Código Deontológico dos Médicos, àquilo que se entende dever ser a conduta adequada ao momento político/legislativo relativo à época (de cada país, já agora).
De novo, a questão salta para a ribalta, neste preciso momento, a propósito da prática do aborto/legislação a aplicar caso vença o sim, e, da objecção de consciência.
Não me vou alongar sobre a questão.
De resto ela não é de hoje, nem tem a ver com qualquer sim ou não saído de um qualquer acto referendário (repetente, de resto).
Mas não posso deixar de dizer o seguinte:
Antes do Juramento de Hipócrates, já se havia codificado a conduta moral dos médicos. Exemplos de tal codificação, encontramo-los no Código de Hamurabi (nome do rei que governou a Babilónia largo tempo (mais de 40 anos, julga-se) e terá vivido entre 1850 a 1750 a.c), no Livro de Hermes-Toltu do antigo Egipto ou no Código de Manau na Índia.
Hipócrates (ele próprio (?), ou o símbolo de valores de mestres pictóricos), é o ícone da emancipação da Medicina face à religião e à magia de rituais, passando desde então a considerar-se a Vida um bem natural e, a felicidade humana, o bem supremo. O conceito do bem e do mal serão sempre discutíveis.
Quando o médico quer exercer qualquer acto na pessoa do doente, deve dizer-lhe exactamente em que consiste tal actuação e assegurar-se de que este percebeu, já que, nem sempre aquilo que o primeiro considera ser bom ou mau, vai ao encontro do que o seu interlocutor entende como tal.
Este "raciocínio" também pode ser lido a partir da iniciativa tomada pelo doente (neste caso grávida, - partimos do princípio de que com uma gestação igual ou inferior a 10 semanas), que se propõe fazer algo (abortar), para o que necessita da colaboração/execução do médico, mas que este considera mal.
A ética é um modo de comportamento humano. Quando o aborto é entendido como eticamente incorrecto (expressão de Amorim Rosa de Figueiredo in "Consentimento para o Acto Médico"), não há legislação/legalização/despenalização/liberalização, que lhe possa ser sobreposta.
Mas nisto também não há verdades absolutas e, afinal, a ética é uma ética de discussão. Só que, por que, o Direito é chamado a intervir, surge uma "ética disciplinar", a definir com certeza e segurança o que é, ou não, lícito fazer.
Pelo lado mais positivista, plasmado nas normas do direito sancionatório (disciplinar ou penal), nada mais fácil de solucionar.
Mas como legislar consciências?
Chegados a este ponto, há que tomar em linha de conta a liberdade. No caso, a liberdade individual para determinar a moral da conduta, para afirmar os próprios princípios, ou seja, reconduzindo-nos à consciência, para a protecção da sua própria consciência e da sua responsabilidade, por decisão própria.
Ora,
mas esta visão não colidirá com a protecção e a salvaguarda da comunidade?
Teríamos de ir fundo, muito fundo na discussão.
Em minha opinião a ética individual em casos de condutas morais tem de prevalecer sobre uma hipotética e alegada ética comunitária que me esmague a vontade e me trate como coisa!